Fios do tempo em forma de haikai

FIOS DO TEMPO: RESISTÊNCIA INDÍGENA EM FORMA DE HAIKAI

Escritora indígena do Rio Grande do Norte lança obra no Dia Internacional dos Direitos Humanos.

por Isabel Taukane (povo Kurâ-Bakairi,  Drª em Cultura Contemporânea, pela UFMT)

A produção de escritores indígenas tem levado o pensamento e o modo de vida indígena para púbico interessado pela temática da cultura indígena. Por outro lado, para escritores indígenas a produção de obras literárias é uma ferramenta de luta e resistência.

A palavra é resistência, resistir é fazer a defesa daquilo que importa para os povos indígenas, os valores ancestrais. O mundo capitalista a cada dia impõe a esses povos uma vida que é alheia, e nos últimos tempos cresceram as ofensivas para diminuir direitos já adquiridos pelos povos originários, na Constituição de 1988.

O livro é uma ferramenta, no qual se faz também conhecer a singularidade dos povos indígenas. A obra literária dá voz para aquilo que não se expressa por palavras, como por exemplo: as árvores, os animais, a água e as aves, entre outros seres. O livro é um meio em que se pode trazer o mundo xamânico, aquele falado pelos pajés; um mundo em que os seres da natureza podem ganhar vida e falar diretamente ao coração das pessoas.

A linguagem do coração, talvez seja a que constitui a poética indígena e a obra “Fios do tempo: quase haikais” da escritora indígena Graça Graúna é um alento, uma mensagem de cura para um mundo que passou por uma pandemia. É um chamamento para retirar as poeiras do luto. É uma convocação para enxergar as belezas que existem na Ameríndia.

O livro está no formato cartonero, isto é, feito artesanalmente um a um pela Editora pernambucana Baleia Cartonera. O movimento cartonero surgiu em 2003, na Argentina, durante a crise econômica e o alto índice de desemprego no pais. Nesse contexto, o livro revela-se como um instrumento de resistência; traz o ativismo e a proposta de sustentabilidade ambiental, revolucionando o sistema de produção de obras literárias. Esses princípios também foram fundamentais para a escolha da escritora indígena Graça Graúna em publicar na editora Baleia Cartonera.

Para saber mais:

QUANDO: 10 de dezembro de 2021, às 19h.

ONDE: https://www.youtube.com/c/UFRPEoficial

SOBRE A AUTORA:

Graça Graúna é indígena do povo Potiguara, do Rio Grande do Norte. Nasceu na pequena cidade de São José do Campestre a 70km das cidades de Goianinha e Canguaretama; onde vivem os parentes indígenas potiguara, na Aldeia Catu. Filha da Terra e de Tupã. Mãe, avó, escritora, educadora, professora na Universidade de Pernambuco (UPE), na área de Literata e atua também, no curso Licenciatura em Ciências Sociais e responsável pelo Blog “Tecido de Vozes” (gracagrauna.com), no WordPress.

Terra fecunda

Ao Katira Ativista a nossa gratidão pela confiança e generosidade por autorizar a publicação da sua arte revolucionária neste “Tecido de Vozes; especificamente o seu quadro/tela em  homenagem aos povos indígenas. Em 19/04/2021, ele escreveu: “Aquele que, no Brasil, fecha os olhos para a sabedoria dos povos originários, está distante de compreender a si mesmo” (@ilustrakat). Assim, convidamos à reflexão sobre o 12 de outubro, considerando que esse dia seja dedicado à Resistência Indígena.

Arte: Katira Ativista

Terra fecunda

“Somos parte da terra e ela faz parte de nós” (Chefe Seatle, 1854)

A Ancestralidade habita o coração da Terra
e dentro de nós
somos tecidos de vozes 
da diversidade de mundos 
de história em história
de memória em memória.

Somos filhos e filhas 
da Terra Viva
da Terra Fecunda 
de Pindorama Terra frondosa

Filhos e filhas
da Terra Madura
do florescimento
nós somos
a multiplicação da semente 
dos povos originários

Estamos aqui.
Nós existimos!
Nós resistimos
e transcendemos o dito 
pré-colombiano... pré-cabralino...

Somos Abya Yala,
Kuna, Chibcha, Mixteca, 
Zapoteca, Ashuar, Huaraoni, 
Guarani, Tupiniquim, Caiapó, 
Aymara, Ashaninka, Kaxinawá, 
Potiguara, Tikuna, Krenak, 
Paiacu, Tarairiú, Terena, 
Quéchua, Karajá, Mapuche, 
Yanomami, Xavante
e muito mais povos
na luta pela vida
por uma Terra sem males

Abya Yala Terra fecunda
Terra madura
e em florescimento

Somos tecidos de vozes
da diversidade de mundos 
de história em história
de memória em memória
a Ancestralidade nos une 
no plantio e na colheita
de abóbora, batata e milho 
entre o que há de sagrado 
para sustentar o céu
e o encantamento

                                                                               
                                                                                          Graça Graúna 
                                                                               (indígena potiguara/RN)