Da Criança em Mim



Quem disse que a saudade não se mede?
A minha saudade é assim:

maior que as tranças da minha vó,
bem mais que o tanto de estrelas no céu
mais que a quantidade de água
e o monte de areia do mar.

A minha saudade é mais forte
que as chuvas de inverno
e mais longa que os raios de sol
que afagam a floresta.

Uma saudade tão boa
quanto o cheiro de terra
que se alastra na aldeia
em dias de chuva.

Saudades do velho pai
nas suas idas pro rio
e alimentar nossa infância
ao pescar umas piabinhas.

Saudades da minha mãe
Lilia, Bisa, Noêmia
por acolher a memória
da sonhadora criança em mim.

Eita saudade grande, maior que o mundo!



Graça Graúna, mulher indígena do povo potiguara/RN
(Dia da Criança, out. 2007)

A respeito da foto.
Uma mangueira centenária na Aldeia Catu/RN, em um dia de chuva. Jan/2023. Foto: G.Graúna

Canto mestizo: resistência e ancestralidade

Ao Programa de Pós-Graduação em Letras, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, registro meus agradecimentos pela grande oportunidade de participar da mesa que focaliza o livro Canto Mestizo. É para mim uma grande honra compartilhar meus escritos e saudar a memória de todos/as que lutam pela Liberdade e Resistência neste país. Minha gratidão, sempre. Graça Graúna

A árvore dos sonhos

Foto: Graça Graúna

(Resenha: Graça Graúna)

As 15h de uma segunda-feira (em 19 de agosto de 2024), o sol encandeou a vista da gente. Nenhuma nuvem por perto. Um super azul celeste se alastrou, enquanto a Rádio Nacional de Brasília anunciou que a Lua Cheia, uma superlua, apareceria no céu; no ponto mais próximo da Terra.

Entusiasmada com essa notícia e considerando também que o tempo de lua cheia contribui bastante para o nosso desenvolvimento cultural; caminhei pela esplanada e fui em busca do livro “A árvore dos sonhos”, escrito por Nora Pimentel e Kamuu Dan.

Dito e feito:  acatando a influência da nossa avó superlua, folheei o livro, li os sonhos e agradeci aos ancestrais a oportunidade de ler mais um livro de literatura indígena. Alegra-me conhecer seus autores e apreender que os nossos sonhos de escritores e escritoras indígenas estão atrelados à “elevação dos espíritos da natureza, [e que teremos] novos desafios e trabalhos”, como afirma a parente Eliane Potiguara na apresentação do livro, e como ressalta também a parente Truduá Dorrico Macuxi, nesse mesmo livro: “…nem o genocídio português nos séculos XVII e XVIII, nem a política da integração republicana, nem o Marco Temporal vigente, nada disso pôde destruir nossos somhos”.

Em conversa, cara à cara, com a escritora e parente Nôra Pimentel; procurei guardar cada palavra do seu relato sobre o lugar onde nasceu: na comunidade Serra Grande, do povo Wapichana, na cidade de Cantá/RR. Em vários momentos da conversa, ela enfatizou que se reconhece em conexão com o povo Aymara, do Peru, e em retomada ancestral. Assim é Nôra: indígena, mãe, avó e cuja infância viveu entre rios e igarapés de Roraima (RR). Nôra busca, por meio da escrita, combater a invisibilidade e considera que “escrever é emergir o desejo do gritar da alma”. Nôra escreveu o livro (A árvore dos sonhos) em parceria com Kamuu Dan Wapichana (Filho do Sol):  autor premiado no Concurso Tamoio, para escritores indígenas. Ativista dedicado à cultura e à medicina tradicional; autor de “Ciranda da Roça”, obra lançada no projeto Entre Parentes, junto ao SESC de Osasco/SP.  

A árvore dos sonhos é um livro de autoria indígena, escrito por Nôra Pimentel e o parente Kamuu Dan. A edição é de 2024, publicada pela Avá Editora (Brasília/DF). Essa obra traz a assinatura de Bartô, na ilustração e a tradução na língua Wapichana, por Nilzimara Wapichana.