Elicura, poeta mapuche: Prêmio Nacional de Literatura 2020
Elicura Chihuailaf
Em meio a tantas notícias ruins que correm pelo mundo, sobretudo nesse tempo de pandemia; algo de muito positivo aconteceu no início de setembro de 2020. Até me atrevo a dizer, com licença poética, que o céu pareceu mais azul; um sonho azul com aroma primaveril e que nos leva à poesia mapuche.
Sim, um sonho azul do poeta Elicura Chihuailaf, o primeiro indígena mapuche vencedor do Prêmio Nacional de Literatura do Chile. Os jornais de vários países destacam a tradição oral e o universo poético e a cultura do povo mapuche que habitam nos livros de Elicura.
Em 2014, o III Caxiri na Cuia, isto é, um encontro de escritores e artistas indígenas coordenado por Daniel Munduruku e promovido pela Universidade de São Carlos (Ufscar), contou com a participação de Elicura, do escritor canadense Cash Ahenakew e de vários escritores e intelectuais e indígenas brasileiros. Esse evento realizou-se na Universdade de São Paulo (USP), onde foi lançado o livro “Sonho azul” de Elicura; numa edição alternativa compartilhada com os parentes indígenas que participaran do referido evento.
Esse livro foi traduzido em português por Patrícia de Moura Leite, e encadernado em folhas de papel sulfite azul, junto ao Grupo de Pesquisa LEETRA, da Universidade de São Carlos (Ufscar). O título do livro do parente mapuche é também o nome do poema (Sonho azul), do qual apresentamos o fragmento que seque:
A casa Azul em que nasci está
situada em uma colina
rodeada de hualles*, um salgueiro
nogueiras, castanheiras
um aroma primaveril no inverno
_ um sol com a doçura do mel de ulmos _
chilcos rodeados a sua vez de beija-flores
que não sabíamos se eram reais
ou visões: Tão efêmeros!
No inverno sentimos cair os carvalhos
partidos pelos raios
Nos entardeceres saímos, abaixo de chuva
ou ao redor, a buscar as ovelhas
(às vezes tivemos que chorar
a morte de algumas delas
navegando sobre águas)
Pela noite ouvimos os cantos
contos e adivinhanças
à beira do fogão
respirando o aroma do pão
modelado pela minha avó
minha mãe e tia Maria
enquanto meu pai e meu avô
_ Lonko/Chefe da comunidade_
observavam com atenção e respeito.
*hualles, aroma, chilcos: árvores
Acerca da premiação de Elicura, cabe sublinhar as palavras de Consuelo Valdés, Ministra da Cultura do Chile. Conforme o Correio Popular (https://correio.rac.com.br/), a Ministra Valdés ao anunciar o prêmio enfatizou a capacidade do poeta mapuche:
[por] instalar a tradição oral de seu povo em uma escrita poderosa que transcende a escrita mapuche […] valendo-se de uma expressão muito própria, ele tem contribuído de forma determinada para difundir seu universo poético pelo mundo, ampliando a voz de seus ancestrais da contemporaneidade
Segundo o Correio Popular (https://correio.rac.com.br/ ), o poeta Elicura faz parte do grupo de escritores que surgiu após o golpe de Augusto Pinochet em 1973, uma geração marcada pelo exílio.
Os noticiários mostram que os textos de Elicura são originalmente redigidos em castelhano e mapudungun (língua mapuche), e traduzidos para dezenas de línguas, nos quais também se destaca o apelo à conversa como única forma de entendimento com os povos indígenas.
A poética de Elicura denuncia a sua condição de indígena exilado. Na entrevista ao site “Crítica.Cl”, o parente mapuche comenta que apesar do deslocamento, a poesia revela que a cada dia ele “aprende a apreciar o que significa habitar no meio de uma diversidade tanto na natureza quanto entre os homens”.
Ameríndia, 10 de setembro de 2020
Graça Graúna
(mulher indígena potiguara/RN)
Que delícia de boa nova! Viajei na Poesia desse confrade indígena e meu coração se alegra com tamanha dádiva. Aguijê! Toikobe a cultura indígena em todas as sua formas e etnias.
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Gratidão, Eva. O parente Elicura merece esse reconhecimento. Viva o povo Mapuche!!!
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Adorei saber sobre esse poeta mapuche e sua linda poesia! Vou buscar outras dele! Ler os escritos indígenas é ter saudade do que nunca tivemos: do tempo ao redor do fogo, do tempo da chuva caindo, do tempo da flor florescendo, do tempo… da vida que passa com a gente, pela gente e para a gente. Um cheiro para vc, Graça.
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Olá, Rita: grande alegria é contar com a sua presença. Que Ñanderu nos acolha! Abraços, Graça Graúna
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