Da Criança em Mim



Quem disse que a saudade não se mede?
A minha saudade é assim:

maior que as tranças da minha vó,
bem mais que o tanto de estrelas no céu
mais que a quantidade de água
e o monte de areia do mar.

A minha saudade é mais forte
que as chuvas de inverno
e mais longa que os raios de sol
que afagam a floresta.

Uma saudade tão boa
quanto o cheiro de terra
que se alastra na aldeia
em dias de chuva.

Saudades do velho pai
nas suas idas pro rio
e alimentar nossa infância
ao pescar umas piabinhas.

Saudades da minha mãe
Lilia, Bisa, Noêmia
por acolher a memória
da sonhadora criança em mim.

Eita saudade grande, maior que o mundo!



Graça Graúna, mulher indígena do povo potiguara/RN
(Dia da Criança, out. 2007)

A respeito da foto.
Uma mangueira centenária na Aldeia Catu/RN, em um dia de chuva. Jan/2023. Foto: G.Graúna

Canto mestizo: resistência e ancestralidade

Ao Programa de Pós-Graduação em Letras, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, registro meus agradecimentos pela grande oportunidade de participar da mesa que focaliza o livro Canto Mestizo. É para mim uma grande honra compartilhar meus escritos e saudar a memória de todos/as que lutam pela Liberdade e Resistência neste país. Minha gratidão, sempre. Graça Graúna

Mari hi: semente de nossos povos

Desenho de Nina. Foto: G.Graúna

Resenha: Graça Graúna

Não é a primeira vez que eu descrevo as emoções que me chegam ao estar em Brasília/DF. Sempre que possível, escrevo acerca das minhas tantas vivências na Capital Federal, aonde o céu aparece em conexão com árvores floridas e diferentes pássaros e as borboletas em bando em direção às nuvens que lembram flocos de algodão, como sugere o desenho do cerrado, pelo olhar da minha neta Nina; mas essa é outra história. Enquanto isso, vamos à narrativa “Mari hi”.

Foto: G.Graúna

Das árvores, registro aqui outros sonhos e um punhado de gente que virou estrela e nos deixou, por um longo tempo, descontentes.  Refiro-me ao livro “Mari hi: a árvore dos sonhos”, ilustrado pelo indígena Gustavo Caboco (povo Wapichana) e escrito por Hanna Limulja (filha de mãe paraibana e pai indonésio).

Na apresentação do livro, o pensamento da parente Geni Núñez (povo Guarani) mostra a riqueza do sonho quando sentido e construído coletivamente. E é com esse espírito que a narrativa “mari hi” nos alerta sobre o pesadelo quando não se respeita o direito de sonhar e de construir o sonho comunitariamente. Nessa direção, a menina Luna (umas das mais importantes personagens da narrativa) conta aos seus pais, que o mundo todo estava em perigo; pois uma criatura horrenda apareceu para tirar os sentidos das pessoas, de maneira que ninguém mais ouvia os cantos dos pássaros; nem sentia o gosto das frutas; a noite não mais exista e o céu desabava. Diante do pesadelo, a personagem Luna procura Davi – um sábio Yanomami da floresta – e pede para ele trazer a noite e os sonhos de volta.

À luz desses acontecimentos, o publico leitor e as pessoas todas que honram ouvir e contar histórias terão a oportunidade de apreender o porque de cada ser do cosmo fazer parte da vida. Nesse ritmo, tomo a liberdade de estampar aqui, as boas palavras do parente Gustavo Caboco, quando autografou para mim o livro Mari hi: “Graça: esse livro é semente de nossos povos”